Atores também passaram fome e frio em novo filme dos sobreviventes dos Andes

No próximo dia 4 de janeiro, quinta-feira, a Netflix estreia o tão aguardado filme ‘A Sociedade da Neve’, que recria, impecavelmente, a história dos sobreviventes dos Andes, após o acidente aéreo nos Andes, em 1972.

O filme tem direção do espanhol J. A. Bayona (‘O Orfanato’ e ‘O Impossível’) e conta a história dos 72 dias em que jovens jogadores de rugby de uma escola uruguaia tiveram que lutar para sobreviver, após a queda do turboélice bimotor Fairchild, no Vale das Lágrimas, em um dos pontos mais inacessíveis da cordilheira dos Andes.

Mas a partida nunca aconteceu. A viagem entre Montevidéu, no Uruguai, e Santiago, no Chile, deveria durar cerca de três horas, mas os passageiros sobreviventes só voltariam para casa mais de dois meses depois.

foto: Netflix

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Prepare os lencinhos (e o estômago), pois Bayona, que também é um dos roteiristas, não poupa ninguém e nenhum detalhe da luta pela sobrevivência sob temperaturas extremas, em um cenário inóspito em que, por onde se olhava, tudo eram imensas montanhas nevadas.

Alimentar-se dos mortos era só uma questão de… fome.

E, assim como as histórias de cada um dos 16 sobreviventes dos Andes, essa super produção espanhola da Netflix também está recheada de curiosidades, que você conhece nos quadros abaixo:


“É uma história que te ensina coisas, que te coloca em um lugar onde você normalmente não está, que te obriga a fazer perguntas a si mesmo.”

Sandra Hermida – produtora
livro
imagem: Reprodução

O LIVRO
O roteiro de ‘A Sociedade da Neve’ é uma adaptação do (potente) livro homônimo de 2008 do jornalista uruguaio Pablo Vierci que conta os fatos, a partir de 16 pontos de vista, “um para cada um dos sobreviventes”, como lembra a produtora, para quem um dos momentos mais interessantes do processo foi reencontrar os jovens que ainda estavam dentro dos sobreviventes que, atualmente, têm mais de 70 anos de idade.

O diretor teve seu primeiro contato com o livro enquanto se preparava para filmar ‘O Impossível’ (2012). Curiosamente, esse filme sobre o tsunami no Índico, em 2004, ganhou seu título, após o próprio Bayona ler uma declaração de Roberto Canessa, um dos sobreviventes dos Andes.

“Os dois filmes contam histórias de duas tragédias humanas que compartilham uma ideia de sobrevivência que não é apenas física, mas também emocional”, conta Bayona, em nota a que o Viagem em Pauta teve acesso.


“O livro está cheio de fortes contrastes entre luz e
escuro e é muito humano. Eu estava especialmente interessado em
o sentimento de culpa que permeia toda a história (…)”

J. A. Bayona – diretor


O ELENCO
Mais de duas mil pessoas compareceram nas seleções de atores para o filme, realizadas na Argentina e no Uruguai.

O maior desafio da diretora de elenco, María Laura Berch, era encontrar não só jovens, fisicamente, parecidos com os personagens originais, mas também que fossem capazes de dar conta da carga emocional que a história exigiria de cada um deles.

Foram selecionados então 40 atores, entre argentinos e uruguaios, a maioria deles com pouca experiência anterior. Ao longo das gravações, os atores estiveram em constante comunicação com os sobreviventes, criando assim uma espécie de “Sociedade da Neve do século XXI”.

“O trabalho [do elenco] era mais sobre incorporar os sobreviventes do que atuar”, descreve Belén Atienza.

foto: Netflix

CARACTERIZAÇÕES IMPRESSIONANTES
Um dos pontos altos do filme, se é que tem algo abaixo do nível de excelência na nova produção de Bayona, é a transformação física dos personagens, ao longo da história.

Assim como lembra o diretor, os atores experimentaram também um pouco do frio e da fome que os sobreviventes vivenciaram. Para isso, semanalmente, o processo foi supervisionado por médicos, nutricionistas e personal trainers.

LIGAÇÕES TELEFÔNICAS
Assim como também conta o diretor, quando surgia uma dúvida no set sobre algum detalhe da história dos sobreviventes, Vierci ligava para pessoas que tivessem vivido a situação que a produção estava tentando recriar.

“Eles [os sobreviventes] sempre foram muito acessíveis e carinhosos, e foram especialmente respeitosos com o processo do filme”, lembra a produtora Sandra Hermida.

LOCAÇÕES
Os ensaios aconteceram em Barcelona, mas muitas das cenas foram gravadas no Uruguai, Argentina e Chile, inclusive no mesmíssimo Valle de las Lágrimas, o local do acidente original.

Para garantir a autenticidade e o extremo realismo do filme, as gravações foram realizadas em diferentes locais e em três etapas.

A primeira delas foi no próprio local do acidente, onde uma equipe de especialistas captou as imagens da paisagem ao redor, em diferentes condições de iluminação. Técnicos (Bayona, o diretor de fotografia Pedro Luque e a supervisora de efeitos visuais Laura Pedro) passaram quatro semanas acampados no Valle de las Lágrimas, uma experiência entre “o desconforto e a motivação”, nas palavras da produtora Sandra Hermida, que ajudou a compreender a intensidade de estar naquele local remoto.

foto: Netflix/Divulgação

“É uma beleza inacreditável, mas assustadora. Quando você está lá, sente que é um lugar perigoso para estar. As montanhas se impõem e não se importam que você seja minúsculo”, descreve o ator Enzo Vogrincic (Numa Turcatti), sobre a experiência de gravar no local original do acidente.

A segunda fase das filmagens foi feita durante a temporada de esqui em Sierra Nevada, na Espanha, onde foram colocadas as réplicas do avião acidentado. De acordo com a produção, a escolha do local se deu porque é ali que fica uma das estações de esqui mais próximas da Linha do Equador e por ter mais dias de luz solar.

As cenas foram gravadas em locações em Cortijo de la Argumosa, Pradollano e na Laguna de Las Yeguas, na província de Granada. Porém, antes de bater o martelo, a produção chegou a cogitar gravar em locais como os Alpes, Pirineus, Argentina, Chile ou nas Montanhas Rochosas, cordilheira entre o Canadá e os Estados Unidos.

A última etapa de gravações foi no Chile e no Uruguai, onde foram rodadas as cenas iniciais do filme, como a introdução dos personagens e o retorno dos sobreviventes.

As cenas do desastre aéreo, porém, foram filmadas nos estúdios da Netflix, em Tres Cantos, a 23 quilômetros de Madri, capital da Espanha. Já as cenas iniciais em que a equipe de rugby embarcou, em Montevidéu, foram gravadas em um aeroporto reconstruído, a partir de um outro terminal abandonado.

foto: Netflix

“Eu queria que fosse um lugar realista e, ao mesmo tempo, muito caloroso e acolhedor”, conta Alain Bainée, designer de produção, contrastando o local do embarque e o cenário inóspito onde os jovens passariam os meses seguintes, nos Andes.

Aliás, outra preocupação das equipes de arte e de figurino foi a seleção das paletes de cores.

Note que, nas cenas nos Andes, não aparece nenhum elemento verde, uma cor associada à “vida e natureza”. Já para as histórias nas montanhas tons brancos e azuis foram priorizados.

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foto: Mauricio Guerra

LOCAL DO ACIDENTE
Para chegar o mais próximo do que aqueles sobreviventes sentiram, o diretor Bayona visitou o local real do acidente, o Valle de las Lágrimas, a quase 4 mil metros de altitude, na fronteira entre o Chile e a Argentina.

Foi ali, aos pés das serras de San Hilario, entre os vulcões Tinguiririca e Sosneado, que o F571 caiu às 15h30 de uma sexta-feira 13, em outubro de 1972.

Bayona descreve sua primeira noite no local como um dos piores momentos da sua vida, quando foi tomado por uma perda da noção do tempo, causada pela altitude, e por uma dor de cabeça constante.

“Mas experimentar o frio extremo, a falta de oxigênio, e a exaustão constante nos ajudou a entender o que personagens principais passaram”, descreve o diretor, que chegou a ir para lá três vezes durante a produção.

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MONTANHAS 3D
Para fazer o o público se sentir dentro das cenas do trágico acidente, a equipe técnica não trabalhou com telas verdes (conhecida como chroma key, em inglês), ferramenta popular no cinema que insere cenários em cenas reais gravadas em estúdios, por exemplo.

“Estudamos a montanha de todos os ângulos para não termos que criar nada, digitalmente. Nesse sentido, nossa viagem ao Vale das Lágrimas nos ajudou muito, em termos técnicos, principalmente, para entendermos as dimensões, as distâncias e a escala da área”, conta Laura Pedro.

Uma vez no set montado em Sierra Nevada, na Espanha, a equipe usou um complexo sistema de telas LED móveis que preenchia a ação dos cenários com imagens 360º feitas no Valle de las Lágrimas.

“O maior desafio digital do filme foi combinar os diferentes sets onde filmamos com o que havia sido filmado no Vale das Lágrimas”, diz Félix Bérges, supervisor de efeitos visuais de ‘A Sociedade da Neve´.

foto: Netflix

IDIOMA ORIGINAL
Na contramão das produções que desconsideram a língua original de seus protagonistas, como o caso recente de Napoleão falando inglês em toda a sua cinebiografia, ‘A Sociedade da Neve’ é totalmente falado em espanhol.

Após mais de 15 anos gravando filmes em inglês, Bayona volta a dirigir uma obra falada em sua língua materna.

“Gravar esse filme foi libertador não só pela língua, mas também porque me permitiu me redescobrir como diretor”, confessa o diretor, que levou uma década para ver pronto o filme sobre os sobreviventes dos Andes.

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