“Caminho sem volta”, diz 1ª brasileira a conduzir navio da Marinha na Antártica

Desde que a explorada Jackie Ronne se tornou a primeira mulher no mundo em uma longa expedição à Antártica, em 1947, pouco parece ter mudado nas explorações do Continente Branco.

Historicamente, viajar naquelas terras inóspitas de condições extremas e operações complexas era quase que uma exclusividade de (heroicos?) exploradores do sexo masculino. Era.

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Em meados de março, a Marinha do Brasil qualificou Sabrina Fernandes, 34, como a primeira mulher da instituição a conduzir um navio das Forças Armadas na Antártica.

“Vivemos em uma sociedade que caminha em direção à igualdade de gêneros. Ainda temos muito a avançar. [Esse] reconhecimento não é pequeno, é um número expressivo para o momento atual. E é um caminho sem volta”, analisa a capitão-tenente encarregada da Divisão de Intendência do Navio de Apoio Oceanográfico Ary Rongel, em entrevista para o Viagem em Pauta.

E só quem já encarou a fúria de uma travessia do Estreito de Drake, um dos mares mais invocados do mundo, sabe o que isso significa para elas.

Sabrina Fernandes (foto: Marinha do Brasil)

Marinha na Antártica

Sabrina, que ingressou na MB, em 2016, é uma das embarcadas na 42ª Operação Antártica (OPERANTAR) que saiu do Rio de Janeiro, em 8 de outubro do ano passado, e tem previsão de retorno no próximo dia 9 de abril.

Além de atuar nas áreas de finanças, abastecimento e alimentação de toda a tripulação, ela participa de atividades operativas como a manobra do navio, na função de Oficial de Quarto.

Na prática, isso quer dizer que, nos últimos meses, Sabrina navegou por dias em condições adversas, em águas distantes e imprevisíveis, em meio a icebergs e “restritos canais austrais”, em benefício de atividades científicas, em áreas como biologia, oceanografia e meteorologia.

“Definitivamente, é uma conquista incrível e motivo de grande orgulho. O desafio não foi pequeno, mas, sem dúvida, muito recompensador.”

Sabrina Fernandes – Capitão-tenente da Marinha do Brasil

Assim como explica Marco Aurelio Barros de Almeida, comandante do navio Ary Rongel, o Oficial de Quarto é “o representante direto do comandante na manobra do navio”, responsável pelo cumprimento da rota, da rotina e da disciplina de bordo.

“É difícil encontrar um paralelo em outras profissões com relação à magnitude das atribuições e à responsabilidade atribuída ao Oficial de Quarto na manutenção da segurança do navio e da tripulação”, descreve o comandante.

Difícil mesmo é ficar longe de casa.

Navio de Apoio Oceanográfico Ary Rongel, ao fundo (foto: Marinha do Brasil)

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“Não bastassem os grandes desafios profissionais, há também a distância dos familiares e entes queridos, por um longo período de tempo, o que potencializa a dificuldade da Comissão. Mas é um motivo de grande orgulho”, relativiza Sabrina, após três meses intensos de estudo para obter o título inédito.

Antes de embarcar, ela participou de treinamentos em simuladores de navegação da Marinha, onde foi exposta a diferentes situações de navegação. Já a bordo, teve também adestramentos com oficiais qualificados para esse tipo de manobra naval.

“Sem eles, essa conquista não seria possível”, lembra Sabrina, em referência aos esforços, dedicação e paciência que a equipe teve durante seu processo de qualificação.

Sabrina Fernandes (foto: Marinha do Brasil)

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Eles no comando

Nos últimos séculos, a Antártica foi marcada pela presença de viajantes do sexo masculino. Que o digam Cook, Weddel, Shackleton, Scott e Amundsen, só para citar algumas das celebridades antárticas.

E foi na literatura deixada por alguns deles que a capitão-tenente Sabrina Fernandes se inspirou, ao ser selecionada para exercer a função no Ary Rongel.

Sabrina se acolheu também na fascinante história de Jeanne Baret, a botânica que se disfarçou de homem para participar da expedição científica de Louis Antoine de Bougainville, em 1766, tornando-se a primeira mulher a circunavegar a Terra.

Não faz muito tempo, porém, que as mulheres eram tidas como despreparadas para as condições antárticas adversas e até uma ameaça ao “senso de unidade do grupo”, nas (equivocadas) palavras de Vivian Fuchs, diretor da British Antarctic Survey, órgão britânico para assuntos antárticos, entre 1958 e 1973.

“Acredito que, a partir desses pioneirismos, dentre os quais incluo minha conquista, novas portas estão sendo abertas para uma sociedade mais justa e igualitária”, aposta Sabrina.

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