Viajantes exploradoras que o mundo esqueceu

Não importa que elas tenham batido recordes, ultrapassado limites ou sido pioneiras em suas áreas. O simples fato de serem mulheres foi suficiente para apagá-las da memória do (masculino) mundo dos exploradores.

Como a pesquisadora Constância Lima Duarte já havia definido, trata-se de um ‘memoricídio’. A propósito, Duarte é a biógrafa da potiguar Nísia Floresta, outra viajante esquecida e 1ª feminista do Brasil.

“As mulheres que ousaram ir contra o patriarcado foram vítimas de um apagamento”, defende Duarte na biografia #Nísia Floresta presente: uma brasileira ilustre (editora Mariana Hardi).

Pensando nisso, o seleto Clube dos Exploradores, em Nova York (EUA), criou a The Society of Forgotten Explorers (A Sociedade dos Exploradores Esquecidos, em português), que homenageia viajantes pioneiros que nunca receberam o devido reconhecimento por suas aventuras, onde estão também algumas mulheres.

Beryl Markham (foto: Creative Commons)

LEIA TAMBÉM: “Nísia Floresta: a feminista viajante, vítima de ‘memoricídio’”


Viajantes exploradoras que o mundo esqueceu

BERYL MARKHAM
(1902 – 1986)

Essa britânica é a primeira mulher a voar o Oceano Atlântico, sem escalas, da Europa para a América do Norte.

Em setembro de 1936, ela decolou com seu avião Percival Vega Gull, de Abingdon, na Inglaterra. Porém, 20 horas depois, sua aeronave cairia próximo a Cabo Breton, no Canadá, por problemas técnicos.

Ainda assim, Markham garantiu o pioneirismo.

FREYA STARK
(1893 – 1993)

Irã, Iraque e Iêmen são alguns dos países nada tradicionais dessa viajante pioneira das explorações no Oriente Médio, no início do século XX.

Assim como lembra o Clube dos Exploradores, essa escritora francesa não só “desafiou as normas sociais e os obstáculos logísticos”, mas também mapeou regiões do Deserto Arábico em suas “narrativas vívidas com precisão antropológica, lançando luz sobre as vidas de pessoas frequentemente incompreendidas ou mal representadas no Ocidente.”

Freya Stark (Domínio Público)

GERTRUDE EDERLE
(1905 – 2003)

Essa estadunidense foi a primeira mulher a cruzar o Canal da Mancha, em 1926.

A penosa travessia, parte dela no escuro e sem orientação nenhuma, durou 14 horas e 34 minutos, ou seja, 1h59 mais rápido do que os cinco homens que chegaram a atravessar a esse braço de mar, entre a Grã-Bretanha e a França.

Para saber mais, não deixe de ver a bela versão dramatizada de sua vida, o longa ‘A jovem e o mar’, disponível na plataforma de streaming Disney+.

Gertrude Ederle (Domínio Público)

HESTER MERWIN AYERS
(1902 – 1975)

Essa artista de Illinois, nos Estados Unidos, viajou para lugares que até hoje são incomuns, entre os viajantes, como Oaxaca, no México, Cabul, no Afeganistão, e Myanmar. Porém, Ayers ficaria conhecida pelos retratos de povos indígenas, feitos durante suas viagens.

Em 1937, por exemplo, foi colíder da ‘Expedição Merwin-Haverlee’, quando desenhou os primeiros retratos de nativos da Lapônia. De 1968 a 1972, foi a vez da África, onde Ayers visitou a Tanzânia, Quênia e Uganda com o mesmo propósito.

Desenho por Hester Ayers (Illinois Women Artists)

ISABELLA BIRD
(1831 – 1904)

Doente desde a infância, essa inglesa de Yorkshire foi recomendada por um médico a cair no mundo.

Não demoraria muito para a jovem pegar gosto pela estrada (ou qualquer outra via de deslocamento) e pisaria em destinos como o Havaí, Austrália e as Montanhas Rochosas, onde escalou o Longs Peak, nos Estados Unidos.

Por essas e outras, lembra o Clube dos Exploradores, suas jornadas ousadas e seus livros de aventuras a levaram a ser nomeada a primeira mulher membro da Royal Geographical Society e da Royal Scottish Geographical Society.

Isabella Bird (Domínio Público)
* com informações do: explorers.org

LEIA TAMBÉM: ““Caminho sem volta”, diz 1ª brasileira a conduzir navio da Marinha na Antártica”


Embora o Clube dos Exploradores não cite nenhum brasileiro (muito menos, brasileiras), o Viagem em Pauta não poderia deixá-las de fora.

Mais do que por Santos Dumont e pelos Irmãos Wright, a história da aviação mundial foi escrita também por mulheres, como as brasileiras Thereza de Marzo e Anésia Pinheiro Machado, que dividem o título de primeira aviadora brasileira.

THEREZA DI MARZO
(1903 – 1986)

Sem apoio da família e com um pai que acreditava que “lugar de mulher era dentro do lar”, essa paulistana é considerada a primeira brasileira a receber o diploma de piloto-aviador internacional, cujo brevê foi tirado após um voo solo, em 7 de março de 1922.

Porém, ao se casar com o instrutor Fritz Roesler, quatro anos mais tarde, Thereza foi proibida de continuar voando, sob a alegação que já bastava um aviador na família. Com 329 horas e 54 minutos de voo em caderneta, a pioneira dos ares brasileiros encerrava a carreira quatro anos depois de iniciada.

Em solo, Thereza continuou trabalhando com o marido na aviação, em projetos como a criação da Escola de Pilotagem e do Clube de Planadores, no Campo de Marte (SP), onde o engenheiro Roesler fabricou os primeiros planadores EAY-101 e os aviões “Paulistinha” EAY-201.

Thereza de Marzo (foto: Instituto Embraer/Divulgação)

ANÉSIA PINHEIRO MACHADO
(1904 – 1999)

Essa paulista de Itapetininga divide com Thereza o título de primeira aviadora brasileira, cujo brevê nº 77 foi recebido com diferença de apenas um dia, segundo o historiador Roberto Pereira.

Instruída pelo mesmo Fritz Roesler, Anésia estreou na aviação em um voo de São Paulo para Santos, no litoral paulista. Mas aquilo foi pouco e, meses depois, ficaria conhecida como a primeira mulher a comandar um voo interestadual no Brasil.

A viagem entre São Paulo e o Rio de Janeiro foi feita em um monomotor Caudron G3 (“Bandeirante”) e durou quatro dias até o destino final. O desafio era voar apenas 1h30 por dia, já que era preciso fazer diversas paradas para reabastecimento e manutenção da aeronave.

E adivinha quem estava à sua espera na chegada ao Rio de Janeiro?

Além de autoridades, Anésia foi recebida por ninguém menos que Alberto Santos Dumont, quem lhe deu uma réplica de uma medalha de ouro recebida pela princesa Isabel, cuja peça a aviadora levou consigo como amuleto até o final da vida.

Instituto Embraer/Divulgação

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*