Ela é dona de títulos superlativos, mas é como um gigante que ninguém vê nem sabe onde fica.
Agoniza na própria diversidade e é retratada como um destino exótico num canto do país onde ninguém vai. Até quem é de lá e passou a vida com a floresta na porta de casa, nem sempre a encontra.
Quando o professor Márcio Souza foi convidado para ministrar um curso sobre a Amazônia, em uma universidade dos Estados Unidos, se deu conta de que não existia um único livro que retratasse a história geral da região para indicar na bibliografia obrigatória.
Ele mesmo tratou de escrever um.
Em seu ‘História da Amazônia”(ed. Record), Souza faz um memorial desse “enorme subcontinente” de diferentes versões. Da geografia ao narcotráfico na região, da conquista ao seu esquecimento. É por esses motivos que este texto começa com spoiler logo no título. A protagonista morre no final (não no final do livro de Márcio Souza, mas ao longo desses últimos anos de agonia).
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Só entre agosto de 2018 e julho de 2019, o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), via projeto PRODES, registrou 10.129 km² de área desmatada nos nove estados da Amazônia Legal Brasileira.
Enquanto do lado de cá, sentados em uma cadeira reclinável com rodinhas de borracha, clicamos em petições online que “lutam” pelos índios da Amazônia e lemos textos exaltados sobre rincões amazônicos onde seus autores nunca colocaram os pés.
A Amazônia em números
– Está presente em 9 países do continente;
– A Amazônia Legal Brasileira abriga cerca de 30% (3,2 milhões de km²) das florestas tropicais do mundo;
– 60% das florestas amazônicas estão localizadas em terras públicas;
– Os 3 estados brasileiros que mais desmatam a Amazônia Legal são o Pará, Mato Grosso e Rondônia;
– Entre 1988 e 2019, por exemplo, o Mato Grosso viu desaparecer mais de 146 mil km² de floresta;
– A taxa de mortalidade pelo coronavírus entre indígenas é 150% mais alta do que a média brasileira.
(fontes: wwww.sejalegalcomaamazonia.org.br / IPAM / IEEE / INPE / “História da Amazônia”)
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História da Amazônia
Autor de “Galvez, imperador do Acre” e “Mad Maria”, Márcio Souza não trata a região como uma massa única de animais selvagens, índios hostis e lendas fantásticas. Seu percurso histórico vai das sociedades hierarquizadas de tempos anteriores aos europeus nas Américas ao momento recente de descaso.
Única e obrigatória, sua obra vem a público para mostrar o que a gente já sabia: nada parece ter mudado na relação entre nativos e forasteiros.
O autor não apenas preenche uma lacuna bibliográfica, mas reafirma a importância do resgate da memória da Amazônia.”
Desde que Francisco Orellana navegou labirintos amazônicos de água potável do Mar Dulce (o primeiro nome do Rio Amazonas), em 1540, aquela natureza bruta de difícil acesso tem terras e nativos saqueados em nome do progresso (de quem invade) e do esquecimento (de quem é dali).
Em quase 400 páginas, “A História da Amazônia” promove um constante encontro entre passado e presente, lembrando-nos da linha tênue entre a selva e o que se compra na farmácia.
“Sem utilização da roda ou de animais de tração, os povos indígenas descobriram e domesticaram mais da metade dos sete grãos alimentícios correntemente comercializados no mundo”, lembra o autor.
E o legado continua na indústria farmacêutica e em outras ciências, na biodiversidade e na variedade cultural que, de longe, lembra a velha ideia de “vazio demográfico” e “natureza hostil” que permeou os relatos dos invasores, ainda tão atuais.
Nem o viajado Dom Pedro II, que se aventurara na Europa e no Oriente Médio, colocou os pés na região. Era tudo tão distante e selvagem, na visão dos europeus, que a atual capital do Pará, Belém, só saberia da independência do Brasil quase um ano depois.
Como descreve Souza, “ainda hoje as populações do Alto Solimões, quando viajam para Manaus, dizem que vão para o Brasil.”
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A viagem do professor/escritor é tão longa que, por vezes, a ideia de dar vida a uma biografia histórica da região oferece capítulos apressados que nem sempre dão conta de abranger o assunto.
Souza aborda em detalhes a Cabanagem e o Festival Folclórico de Parintins, mas corre na construção da Transamazônica ou no capítulo sobre a Guerrilha do Araguaia. “A História da Amazônia” vai da descoberta do ouro branco à Belle Époque amazônica, das técnicas primitivas à favelização de grandes centros urbanos de Manaus.
Se falta espaço para tanta história na maior floresta tropical do mundo, sobram questionamentos sobre um dos territórios mais ricos e menos explorados do planeta.
E isso o autor faz muito bem nos capítulos dedicados a tantas Amazônias que margeiam o percurso sinuoso desse “pedaço imenso, mas pouco conhecido”.
SAIBA MAIS
“A História da Amazônia” (Márcio Souza)
392 páginas
www.record.com.br
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