Após anunciar que queria dar uma volta ao mundo em menos tempo que o protagonista do clássico de Júlio Verne, a repórter Nellie Bly teve que ouvir que para fazer tal viagem era preciso ser homem e ter um acompanhante que carregasse tanta bagagem.
– Muito bem. Mande seu homem e eu vou começar no mesmo dia por outro jornal, e vou vencê-lo, respondeu com raiva, naquele final de século XIX.
Bly não só venceu, abraçando o mundo em 72 dias, como também conseguiu viajar pelo mesmo jornal ao qual tinha feito a sugestão de pauta.
Mais de um século depois, a situação parece um pouco mais animadora, embora viajar desacompanhada seja uma preocupação de muitas

SAIBA MAIS: “As viagens de Tamara Klink, a menina que cresceu e partiu”
Hoje em dia, mais do que dinheiro ou estabilidade financeira, a mulher quer poder viajar.
Pelo menos é o que aponta a pesquisa feita pelo Think Olga, publicada neste sábado no jornal Folha de São Paulo. Segundo o instituto de soluções para as desigualdades de gênero, a maioria das mulheres deseja viajar, independente da classe e da idade.
Para celebrar este 8 de março, o Viagem em Pauta selecionou histórias de viajantes brasileiras que já contaram suas histórias aqui no site e pode ser uma inspiração para você.
Brasileiras que viajam
Tamara Klink
Essa paulistana bem que poderia ter escolhido um emprego de segunda a sexta, daqueles explicáveis “em uma palavra só”, mas preferiu navegar em solitário, singrando fiordes, pegando tempestades e navegando sob noites que chegam mais cedo no norte do planeta.
Aos 24 anos, Tamara se tornou a mais jovem brasileira a cruzar o Atlântico em solitário, entre agosto e novembro de 2021. No ano anterior, a velejadora já havia feito sua primeira travessia em solitário com o veleiro Sardinha, comprado sem que a família soubesse, cruzando o Mar do Norte, entre a Noruega e a França.
Tamara, que também é mecânica, eletricista e skipper, estudou arquitetura naval na França e escreveu sobre viajar sozinha com o mar como única companhia.
Jéssica Paula
Entre as viajantes brasileiras, essa goiana de Rio Verde é a primeira mulher paraplégica a escalar uma das faces do Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro.
E o que mais a motivou deixar seu lugar de conforto para ver o Rio de outro ângulo foi, justamente, ter ouvido que ela não conseguiria, devido ao grau de dificuldade e das suas condições físicas.
“A autoconfiança é o mais difícil de conquistar. É olhar para algo que nunca foi feito antes e dizer que você pode ser a primeira. Tem que se bancar, mas às vezes a gente tem receio de não conseguir”, contou para o jornalista Eduardo Vessoni, dias antes da escalada.
A escalaminhada (caminhada em trilhas de ascensão) foi em um terreno com até 75° de inclinação, em uma rocha de granito de quase 400 metros e trechos com subidas por cordas, trilhas e paredões verticais.

LEIA MAIS: ““Atreva-se”: conheça a 1ª paraplégica a escalar o Pão de Açúcar (RJ)”
Aretha Duarte
Essa campinense é a primeira mulher negra e latina a alcançar o cume da montanha mais alta do planeta, em 2021, endereço de homens brancos dispostos a pagar cerca de R$ 400 mil pela experiência.
Em 2024, o documentário ‘Aretha no Everest’ foi um dos destaques do Rocky Spirit, considerado o maior festival de filmes outdoor do Brasil, realizado no Parque Villa-Lobos, em São Paulo.

Susanne Schirato
No final do ano passado, essa artista paulistana se tornou membro do cobiçado Clube dos Exploradores (EC), em Nova York.
A conquista foi dupla: ser mulher e uma dos três únicos latino-americanos, em uma lista com mais de 50 novos nomes de nacionalidades, tradicionalmente, associadas ao mundo das explorações, como a Grã-Bretanha, Noruega e Estados Unidos.
Schirato entrou para uma lista de cerca de 3.500 membros internacionais, em mais de 60 países e das mais diversas áreas da ciência, como montanhismo de conservação, exploração polar e espeleologia, entre outras.
“Ser mulher [num ambiente, extremamente, masculino] é persistir sempre. Esse título é importante para todas as outras e comprova que, sim, nós podemos. Eu tenho duas filhas, uma de 10 e outra de 14 anos, e quero mostrar que elas podem fazer o que quiserem”, descreve Schirato, em entrevista para o Viagem em Pauta.

Sabrina Fernandes
Em março do ano passado, a Marinha do Brasil qualificou Sabrina Fernandes como a primeira mulher da instituição a conduzir um navio das Forças Armadas na Antártica.
E só quem já encarou a fúria de uma travessia do Estreito de Drake, um dos mares mais invocados do mundo, sabe o que isso significa para elas.
Além de atuar nas áreas de finanças, abastecimento e alimentação de toda a tripulação, ela participou de atividades operativas como a manobra do navio, na função de Oficial de Quarto, navegou por dias em condições adversas, em águas distantes e imprevisíveis, em meio a icebergs e “restritos canais austrais”, em benefício de atividades científicas, em áreas como biologia, oceanografia e meteorologia.
“Vivemos em uma sociedade que caminha em direção à igualdade de gêneros. Ainda temos muito a avançar. [Esse] reconhecimento não é pequeno, é um número expressivo para o momento atual. E é um caminho sem volta”, analisa a capitão-tenente encarregada da Divisão de Intendência do Navio de Apoio Oceanográfico Ary Rongel, em entrevista para o Viagem em Pauta.

SAIBA MAIS: ““Caminho sem volta”, diz 1ª brasileira a conduzir navio da Marinha na Antártica”
Karina Oliani
Essa apresentadora e médica especialista em medicina de emergência e resgate em áreas remotas é a primeira brasileira a escalar o K2 e a primeira sul-americana a subir as duas faces do Everest.
Seu desafio mais recente foi cruzar a Passagem do Noroeste, no encontro dos oceanos Atlântico e Pacífico, região acima do Círculo Polar Ártico.
Entre as atividades da tripulação liderada por Sylvestre Campe, teve escalada em icebergs, wakeboard na “capital mundial dos icebergs” e mergulho em gelo.
“É único porque a geografia local faz com que esses icebergs fiquem presos nessa baía, formando uma concentração absurda de icebergs”, diz Oliani sobre a cidade de Ilulissat, na costa ocidental da Groenlândia.

LEIA MAIS: “Escalando uma “montanha que mexe”: brasileiros relatam experiência no Ártico”
Seja o primeiro a comentar