Chiloé é o Chile que você (ainda) não conhece

No sul desse país estreito e bem perto da Patagônia, existe um Chile que vai além das areias do deserto mais árido do planeta e das bem estruturadas estações de esqui.

A menos de 200 km do aeroporto de Porto Montt, na Região dos Lagos, o arquipélago de Chiloé é o Chile que a gente custa a acreditar que existe.

A segunda maior ilha do país tem trilhas em cenários surreais, é endereço de esportes de aventura, abriga igrejas de madeira que são patrimônio da humanidade e ainda consegue encantar com mitos que, mais do que contar histórias de personagens fantásticos, viraram atração da região.

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O que a terra não dá, o mar dá

Por ali, terra e mar parecem um só. Não só na hora de fazer turismo, mas também nas famosas histórias que contam em Chiloé, como a que explica a origem desse arquipélago com cerca de 35 ilhas.

Dizem que Caicavilu, serpente do mar e inimiga da vida terrestre, teria inundado toda a região, tentando transformar tudo em mar. Mas Tentenvilú, a serpente da terra que protegia a região das invasões marinhas, elevou as colinas chilotes para que a população pudesse se refugiar.

E, como dizem por ali, “o que a terra não dá, o mar dá”.

O QUE FAZER EM CHILOÉ

Confira passeios em Chiloé que o Viagem em Pauta conheceu no arquipélago, em sua última visita ao destino, a convite do hotel Tierra Chiloé.

Patrimônio da humanidade

Com 16 templos religiosos declarados patrimônios da humanidade pela UNESCO, de um total de 60, Chiloé é conhecida por suas coloridas igrejas de tons fortes, seja nas grandes cidades ou em povoados minúsculos.

Curiosamente, todas as igrejas de Chiloé seguem um mesmo padrão arquitetônico, como o teto em forma de bote invertido, pilares internos de madeira com pinturas que simulam mármore e uma coleção de santos em gesso (trazidos sobretudo da Europa) e os de madeira (feitos na ilha).

Igreja Nossa Senhora do Rosario, em Chelín (foto: Eduardo Vessoni)

“No início, todas as igrejas de Chiloé foram usadas como farol, como um ponto de referência. Além disso era um ato para marcar a presença espanhola na região”, conta a guia de excursões Marjorie Loyer Moreli.

Entre as construções de madeira abertas à visitação, mediante colaborações simbólicas, um dos destaques é a igreja Nuestra Señora del Rosario, na ilha de Chelín, que pode ser combinada com uma travessia de caiaque.

A Ruta de las Iglesias inclui também a de Nuestra Señora de los Dolores, em Dalcahue, a 78 km de Ancud, erguida no século 19, e a Iglesia de San Francisco, em Castro, capital da província de Chiloé.

Caiaque com golfinhos

No centro da Ilha Grande de Chiloé, as ilhas Chelín e Quehui, em Castro, ficam em meio a um emaranhado de outras pequenas ilhas voltadas para o continente.

Uma das atividades mais marcantes em suas águas geladas é a travessia de caiaque, uma atividade de 45 minutos de travessia em caiaque de travessia, cuja estrutura mais pesada permite melhor deslizamento.

Travessia de caiaque entre Chelín e Quehui (foto: Eduardo Vessoni)

Cidade dos três andares

A 23 km da capital Castro, aproximadamente, Chonchi é conhecida como a ‘Ciudad de los Tres Pisos’, devido à sua localização em meio a três terraços naturais.

O destino é famoso pela produção do licor de ouro, bebida artesanal feita com soro de leite, açafrão e ovo, e também por suas casas de madeira de cipreste, erguidas no início do século passado.

Embora estejam sendo substituídas por outros materiais como cimento e tábuas de madeira, essas construções chilotes foram originalmente erguidas com fachadas de tejuela, como são chamadas as madeiras sobrepostas em forma de escamas.


Pacífico selvagem

A trilha Duhatao-Chepu, em Ancud, cruza um dos cenários mais selvagens do Pacífico, no noroeste de Chiloé.

São nove quilômetros de caminhada de dificuldade alta pela Costa do Pacífico, passando pela Cordilheira da Costa, uma das formações mais antigas do Chile, e cruzando bosques sempre-verdes, mesmo no inverno, e colinas de acesso à praia do Rio Chepu.

Devido às condições do solo, essa caminhada não é recomendada durante a temporada de chuvas.

Trilha Duhatao-Chepu (foto: Eduardo Vessoni)

Bosque alagado

A trilha anterior pode ser combinada com uma visita a esse cenário impactante, resultado do poderoso terremoto que atingiu Chiloé, em 1960, considerado o mais potente do mundo.

De magnitude 9,5 e seguido por um tsunami, o fenômeno teve epicentro na cidade de Valdivia e alterou o percurso de rios de Chiloé. É daí que surge esse bosque alagado, que pode se visitado em passeios de barco pelos braços interiores do Rio Chepu que, após o cataclismo de 1960, tornou-se um dos mais extensos de Chiloé.

Bosque alagado (foto: Eduardo Vessoni)

Mitos

Mar e terra sempre estiveram conectados, em Chiloé. Não só pelas construções sobre as poucas palafitas que ainda podem ser vistas em Castro, mas também pelos personagens mitológicos que rondam o imaginário local.

Para conhecer alguns deles, não deixe de visitar a Plaza de Armas de Ancud, onde estão obras assinadas pelo escultor Ramón Pérez, o Moncho. Feitas com pedra cancagua (rocha sedimentar de origem vulcânica), as esculturas homenageiam figuras mitológicas como Caicavilu, Tentenvilú e o Trauco, o feioso que, após seduzir as moças, as leva para um bosque.

“A origem da mitologia de Chiloé é uma mistura do que se costumavam acreditar os indígenas locais e os europeus do Velho Mundo. Algo para controlar e ensinar, mas sobretudo, para entreter”, explica o guia Francisco Eliseo Alarcón González.

La_Fiura (foto: Eduardo Vessoni)

Outro mito famoso é o da Fiura, filha e esposa do Trauco, conhecida como a mulher dos pântanos e que se satisfaz com as maldades que prepara para os homens.

Do lado oposto da Iglesia San Francisco, a Plaza de Armas de Castro abriga uma estátua dedicada à Pincoya, figura conhecida por sua dança em frente ao mar. Se no ritual Pincoya termina virando-se para o mar é indício de que haverá abundância. Caso contrário, serão tempos de escassez.

E em terras tão conectadas com o mar, é de lá que surge um dos mitos mais conhecidos de Chiloé: o Caleuche, um animado barco fantasma que desaparece quando não quer ser visto.

COMO CHEGAR
As principais cidades de Chiloé são Ancud – a mais turística delas e a mais ao norte da ilha principal; Castro – terceira cidade mais antiga do Chile, fundada em 1567; e Quellón, no extremo sul.

Para quem vem do norte, são 57 km do aeroporto de Porto Montt até Pargua onde se faz uma travessia de 30 minutos em balsa até Chacao (saídas durante todo o dia e noite), no extremo norte da Ilha Grande de Chiloé. Já quem vem do sul, o acesso é por Quellón, no sul do arquipélago.

Os aeroportos mais próximos ficam em em Castro, em Chiloé, e Porto Montt, no continente.

QUANDO IR
Com um pé na Patagônia e outro no Pacífico, Chiloé costuma ter temperaturas mais baixas, entre 0 e 20°.

De maio a setembro, as chuvas são mais fortes e pode chover sem parar, durante semanas; julho e agosto são marcados pela temporada de ventos; entre dezembro e março, os dias são mais quentes, o mar mais tranquilo e os ventos mais suaves. Já fevereiro é o mês mais seco.



Tierra Chiloé

A 15 km de Castro e em frente ao pantanal de Pullao, em San José, o hotel tem arquitetura inspirada nas tradições de Chiloé, como o teto em forma de barco invertido que parece flutuar sobre uma estrutura em forma de palafita, porém sem ser um edifício invasivo à paisagem.

Em uma área de 23 hectares, na Baía de Rilán, atualmente, o empreendimento tem 24 quartos com janelas panorâmicas com vista para o destino. Apesar das cômodas e bem aquecidas, o Tierra Chiloé convida o hóspede a ficar do lado de fora (e é daí que vem a variedade de atrações que provamos em Chiloé).

Pantanal de Pullao, em Chiloé (foto: Eduardo Vessoni)

A rede, que conta também com unidades na Patagônia chilena e no Deserto do Atacama, é conhecida pelo cardápio de excursões ao ar livre que já estão incluídas nas diárias, sem que o hóspede tenha que se preocupar com detalhes de traslados, excursões e alimentação.

As tradições chilotes estão também dentro do hotel, cuja decoração mescla peças artesanais locais e obras de grandes nomes da arte chilena, como teares, lustres feitos com palha e o mapa do arquipélago pintado pela artista Claudia Peña.

Tierra Chiloe (foto: Divulgação)

Outro destaque é a culinária do restaurante, cujas refeições também estão incluídas nas diárias, com pratos que levam ingredientes como ostras e peixes, além do tradicional curanto, mariscos preparados entre pedras quentes, em um buraco na terra.

Tudo servido em um salão de janelões de vidro com vista para uma Chiloé inteira, do lado de fora.

* Viagem feita a convite do hotel Tierra Chiloé

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