Morreu no dia 26 de julho, o artista José Francisco Borges, mais conhecido como J. Borges, era Patrimônio Vivo de Pernambuco e um dos mais importantes xilógrafos do Brasil.
O artista tinha 88 anos e ficou conhecido, mundialmente, por suas xilogravuras que retratavam destinos nordestinos como Garanhuns, Caruaru e Limoeiro, além de elementos culturais nordestinos, como boi-bumbá, reisado e cangaço.
“Eu só faço trabalhos relacionados aos costumes e à vida do Nordeste porque eu considero o Brasil da Bahia para cá. É um Brasil natural, de sangue nordestino”, disse o artista, no ano passado, em entrevista para o jornalista Eduardo Vessoni, editor do Viagem em Pauta.
J. Borges nasceu e viveu em Bezerros, município do Agreste pernambucano, a 100 quilômetros do Recife, onde ele mantinha o concorrido ateliê aberto ao público.
Sua relação com as artes começou ainda na infância, quando quis se alfabetizar, aos 12
anos, para poder ler os cordéis que o pai costumava levar para casa.
Por isso, lia tudo que passava diante dos olhos: jornal velho, revista de embrulhar sabão e o que “vinha voando na estrada”. Para escrever, usava carvão para deixar sua marca “em toda a superfície que aparecia”, como calçada, pedra, casa velha e “pé de pau”.
Já as famosas paisagens que ilustram suas obras são do tempo em que J. circulou pelo Nordeste, durante 20 anos, como vendedor de cordel em feiras do interior.
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J. Borges: do Nordeste para o mundo
Borges esteve em mais de 10 países, como Alemanha, Cuba e Suíça. Sem falar nas palestras que deu no Novo México, nos Estados Unidos.
Aliás, o artista já foi chamado de “Picasso do Nordeste”
– “E o senhor concorda com esse título?”, perguntei durante nosso encontro em seu ateliê, em Bezerros.
– “Eu não sei porque eu não conheci Picasso (risos). Hoje, um trabalho dele custa um ou dois milhões de dólares. O meu ainda custa R$ 30, R$ 40”, comparou, humilde, durante a entrevista de quase três horas de duração.
Para ele, eram os preços baixos de seus trabalhos que fizeram com que sua arte chegasse a todos os cantos do Brasil.
– “O turista que gosta de arte chega aqui e fica abismado. Então ele compra 8 ou 10 gravuras por esse preço para dar de presente”, explicou.
Mas o maior responsável por sua fama, de acordo com o próprio artista, foi ninguém menos que Ariano Suassuna que, quando viu seus trabalhos pela primeira vez, perguntou “onde mora esse fera?”
A ponte entre Suassuna e Borges foi o artista plástico Ivan Marchetti, na década de 1970.
– “Tenho tenho um filho com o nome dele. Mas é Ariano “peba”, porque o legítimo já foi”, lembrou, mais uma vez, aos risos.
E, desde então, segundo o próprio Borges, ele não teve mais sossego na vida. “No bom sentido”, fez questão de esclarecer.
Não é a toa que sua cidade natal até hoje é sinônimo de xilogravura.
O que é xilogravura
Essa antiga técnica chinesa de gravura em madeira funciona como uma espécie de carimbo com imagens reproduzidas, a partir de uma matriz.
Feito em versos por trovadores medievais e trazido ao Brasil pelos portugueses, o cordel tem esse nome por conta da tradição de ser exposto em cordas ou barbantes.
Patrimônio Cultural Brasileiro pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), desde 2018, a Literatura de Cordel teria surgido com os versos escritos por trovadores medievais e trazido ao Brasil pelos portugueses.
A palavra “cordel” se deve à antiga tradição de expôr o trabalho final em cordas ou barbantes.
Porém, J. Borges não só levou seu cordel para o mundo como também deu cores para aqueles trabalhos, tradicionalmente, feitos em preto e branco.
“A decisão não foi nem minha, foi do púbico, dos meu clientes. Um dia, uma mulher me perguntou por que eu não fazia colorido? Ficava melhor”, contou.
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