Centenário de morte do explorador Ernest Shackleton

A viagem do irlandês Ernest Shackleton pela Antártica tinha tudo para dar errado. E deu.

Fã de aventuras, o explorador esteve em expedições históricas como a Discovery (1901-1904) e Nimrod (1907–09). Mas sua viagem mais famosa foi a Expedição Transantártica Imperial, entre 1914 e 1917, considerada a última grande viagem da Era dos Descobrimentos.

A empreitada, uma das mais impressionantes histórias de sobrevivência, pretendia cruzar o Continente Branco a pé, de ponta a ponta, entre o mar de Weddell e o Polo Sul.

foto: Domínio Público


No entanto, não se esperava que a expedição chegaria ao fim bem antes daqueles homens alcançarem terras geladas do sul do planeta.

Shackleton não imaginava mudanças climatológicas no continente e viu seu barco ser consumido pela movimentação de imensas placas de gelo que impediam a continuidade da viagem.

E o melhor da história (e o pior da experiência) começa agora.


INFERNO GELADO

Placas congeladas que abraçavam o barco, estrutura de madeira que rangia com a pressão do gelo e dias que viraram noite, sob temperaturas externas que variavam entre 20 e 30 graus negativos.

Presos no gelo por oito gélidos meses, aqueles 28 homens abandonariam o Endurance em outubro de 1915. O último resgate só aconteceria em agosto do ano seguinte, 10 meses depois.

Para passar o tempo, partidas de futebol, teatro, concertos de gramofone, campeonato de corte de cabelo e corridas de cachorros eram organizados. E a temperatura, lá fora, caindo.

A “batalha de gigantes”, na definição do líder da expedição, começou quando o inverno chegou: temperaturas a 30 graus negativos, cachorros mortos por parasitas no estômago e dias sem luz natural.

Sobrou até para as focas, que foram usadas para garantir combustível e alimentos.

Domínio Público

Em plena Primeira Guerra Mundial, esses seriam apenas relatos escritos, não fossem os registros feitos pelo fotógrafo Frank Hurley, um dos 28 homens que ficaram à deriva no extremo sul do planeta, entre 1914 e 1916.

A relação entre o chefe da expedição e Frank Hurley não era das melhores. Arrogante e mandão, o australiano era visto por Shackleton com desconfiança, embora o incluísse “em todas as discussões importantes”.

Assim como lembra Caroline Alexander no livro “Endurance: a lendária expedição de Shackleton à Antártida” (ed. Companhia das Letras), as habilidades técnicas do fotógrafo ajudaram na criação de instalações elétricas, bombas e fogões improvisados.

A obra de Caroline é um dos mais belos registros dedicados a essa viagem histórica, sobretudo pela variedade de fotos históricas feitas por Hurley, os únicos registros fotográficos daquela empreitada polar.

“O que o gelo prende, o gelo não larga mais”.

Vista noturna do Endurance, no Mar de Wedell (foto: Domínio Público)

A frase desanimadora de um dos tripulantes do Endurance anunciava o que viria pela frente. Ainda assim, Hurley conseguiu ver poesia em tudo aquilo.

Na primavera de 1915, ao sair com a câmera pela manhã, encontrou melhores condições de clima e descreveu aquela imensidão branca como uma “linda safra de flores de gelo formando-se nas veredas de mar aberto [que] lembravam um campo de cravos vermelhos.”

Enquanto o barco esteve à deriva no Mar de Weddell, algo em torno de 1.100 km segundo Caroline Alexander, Hurley se perguntava: “o que vai ser disso tudo?”

CONFIRA FOTOS DA ANTÁRTICA

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